Os comandos confusos da CVM e da Lei S/A
A Lei 6.404/76 e as instruções da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) empregam de forma corriqueira os verbos "publicar", "divulgar", "disponibilizar" e "comunicar" para tratar da obrigação imposta a companhias fechadas e abertas de dar publicidade aos atos societários que interessam aos acionistas e a terceiros. Contudo, o regulador, muitas vezes, utiliza esses termos de maneira indiscriminada, como se correspondessem a uma ordem de igual alcance. Vamos a alguns exemplos.
No art. 3º da Instrução 358, a CVM diz que "cumpre ao diretor de relações com investidores divulgar e comunicar (…) qualquer ato ou fato relevante ocorrido ou relacionado aos seus negócios". No §4o da mesma norma, é dito, então, que essa divulgação deverá se dar através de "publicação nos jornais de grande circulação utilizados pela companhia". Ou seja, no art. 3º, o regulador usa o verbo "divulgar" no sentido de "publicar", já que a informação deve ser veiculada em jornal. Outro exemplo de mau uso dessas palavras é a adoção do verbo comunicar como sinônimo de publicar. Isso pode ser visto no art. 133 da Lei das S.As. O parágrafo menciona que os "administradores devem comunicar, até 1 mês antes da data marcada para a realização da assembleia-geral ordinária, por anúncios publicados na forma prevista no artigo 124, que se acham à disposição dos acionistas: o relatório da administração (…)". Há situações ainda mais complexas, como o emprego do verbo "comunicar" como sinônimo de "divulgar", mas significando "publicar". É o caso do art. 12 da Instrução 480: "O emissor deve comunicar aos titulares dos valores mobiliários, na forma estabelecida para divulgação de fato relevante, as medidas tomadas para o cumprimento das obrigações de que trata o caput (…)". Como foi visto no primeiro exemplo, a divulgação de fato relevante é, na verdade, uma publicação em jornal.
Essas situações dificultam o cumprimento da obrigação legal de publicação dos atos societários, principalmente pelos diretores de relações com investidores. Numa pesquisa sobre o assunto, identifiquei outros exemplos para, ao fim, delimitar o que significa (do ponto de vista da regulação) a obrigação de publicar, divulgar, disponibilizar e comunicar imposta às companhias. Em resumo, cheguei às seguintes conclusões:
- publicar: indica a obrigação de veicular — na imprensa oficial dos estados ou em jornal de grande circulação na localidade em que está situada a sede da companhia — os atos societários que interessam aos acionistas e a terceiros;
- divulgar: é empregado para designar a ordem genérica, aberta e inespecífica de transmitir e disseminar informações, seja a um destinatário identificado, seja para a mídia. Essa flexibilidade confere ao responsável pela divulgação margem de discricionariedade no cumprimento do dever legal;
- disponibilizar: indica, para a companhia, a obrigação de finalizar a informação de modo a torná-la apropriada para exame da coletividade. Cumprida essa etapa, cabe à empresa depositá-la em local apropriado para consulta (sede da companhia, endereço eletrônico, sistema IPE); e
- comunicar: é utilizado com mais frequência no sentido de transmissão direta de informações a um destinatário específico e identificado, por meio de veículos igualmente específicos (telegrama, ofício, mensagem eletrônica).
Espera-se que a pesquisa sirva de base à reforma pontual da regulamentação de modo a eliminar conflitos de interpretação e dirimir a insegurança no seu cumprimento.
Fonte: "Comandos Confusos" – Revista Capital Aberto, via Contabilidade Financeira (grifos nossos)