Uma abordagem histórico-conceitual da auditoria fiscal

Uma abordagem histórico-conceitual da auditoria fiscal

Por José Amândio Barbosa

Antecedentes históricos 

Presume-se que o surgimento da Auditoria Fiscal se deu pari-passu com a criação de tributos nos primórdios da civilização; tabletes de barro datados de 4.000 anos a.C., encontrados na Mesopotâmia, já faziam referência à exigência de tributos; mais tarde, os egípcios, por volta do ano 3.000, a.C., coletavam impostos em dinheiro ou em serviços e eram muito rigorosos na sua fiscalização. A história mostra que a civilização humana não existiria sem os impostos e sua captação não produziria os efeitos desejados sem os controles adequados, ou seja, sem um trabalho de auditoria. Os monarcas sumerianos mandavam seus vassalos às terras conquistadas para verificar, dentre outras coisas, se os impostos estavam sendo pagos normalmente. Estes vassalos chegaram a ser conhecidos como “os olhos e os ouvidos do rei”.

Situação atual 

A Auditoria Fiscal como técnica especializada da área contábil assim como sua prática por profissionais diretamente ligados ao setor empresarial é de uso bem recente. No passado, por longo segmento histórico, nas manifestações dos procedimentos empregados em auditoria, predominava a chamada “auditoria repressiva” e o seu exercício sempre esteve a cargo dos agentes governamentais com o objetivo básico de verificação da regularidade das contribuições tributárias.

No Brasil, segundo o Prof. Hamilton Parma, em artigo publicado na Revista Brasileira de Contabilidade, “até a década de 60, era indiscutível e inquestionável a eficiência do aparelho externo fiscalizador federal formado por um corpo técnico que, por si só, era causa e efeito, ao mesmo tempo, de elevado gabarito, portador e criador de know how específico e intransferível, eficiência temida e respeitada, dignidade profissional praticada no seu mais alto nível”. Diz mais o Prof. Parma que, “com a evolução do Direito Tributário, o instrumento fiscal modificou-se, adaptou-se à filosofia, da qual emerge, e, de simples instrumento de arrecadação de recursos para manter a máquina burocrática estatal, passou a desempenhar um papel mais importante, qual seja, o de verificar a repercussão dessa arrecadação no campo econômico e social”.

O Auditor Fiscal ou Auditor da Receita, como hoje são denominados os agentes do Governo Federal, Estadual e Municipal, àquela época eram conhecidos como Fiscais de Rendas. A mudança se deu no seio da Administração Governamental, a partir da grande Reforma Administrativa surgida no início da década de 60, primeiramente no Estado da Bahia, que teve a sua Reforma implantada antes mesmo da Federal.

Até então os trabalhos dos agentes fiscalizadores do Governo não se revestia das boas técnicas de auditoria, hoje regulamentares, pois até ali a Auditoria Fiscal tinha como objetivo básico a verificação da regularidade das contribuições tributárias, mas, a partir de 1964, com a implantação da nova filosofia governamental, foi agregado o objetivo de natureza administrativo-tributária o sentido econômico-social. O conceito de legislação tributária se ampliou e se aperfeiçoou passando a abranger vastos campos da atividade e do saber humano. A verificação do cumprimento da legislação tributária se tornou mais complexa e mais difícil, em face do crescimento vegetativo e adicional das empresas. A moderna filosofia da Auditoria Fiscal repousa na premissa de que convém às Administrações Tributárias a reintegração dos contribuintes que se afastaram da sua comunidade, com ela não cooperando no custeio dos serviços proporcionados, não participando dos seus problemas e soluções e dela se servindo através da fraude e da competição desleal com a redução ou eliminação dos custos integrantes do bem produzido e comercializado, ou dos serviços prestados. A ação fiscal era, e continua sendo, o instrumento capaz de fazer a reintegração destes contribuintes no meio em que vivem e convivem. Tem, portanto, o sentido social de defesa dos participantes da comunidade, da imposição da justiça fiscal e do resguardo do princípio de igualdade de todos perante a Lei, além dos tradicionais sentidos de defesa do Erário, do respeito ao Poder e da moralidade pública. O Auditor Fiscal percorre um vastíssimo campo da atividade humana, analisa os fatores de produção, caminha pelos setores primário, secundário e terciário da economia, navega nas águas das atividades sensoriais, enfim, tem pela frente toda a atividade econômica.

As empresas brasileiras levaram muito tempo, no que diz respeito à área fiscal, servindo-se, bem ou mal, dos trabalhos dos auditores externos oriundos dos quadros governamentais. Para as empresas que primavam pela regularidade das suas obrigações fiscais, a visita do Auditor Fiscal era saudada com ênfase porque, no final, eles deixavam sempre um parecer satisfatório. Para outras, mesmo com irregularidades presentes, era a única forma de corrigi-las a tempo e prepará-las para evitar reincidências; estas, eram aquelas que erravam por negligência, por falta de competência dos empregados, por má interpretação da legislação ou por outros motivos não premeditados.

Modernamente com a gama de impostos diversificados e, todas a três esferas do poder tributante e a multiplicidade das obrigações acessórias, o Sistema Tributário Nacional tem gerado para as empresas uma necessidade crescente de adotar controles administrativos para atender às exigências legais e se manter em dia com as suas responsabilidades fiscais. Os Governos têm, através dos sistemas de autolançamento, de retenção e de substituição tributária, delegado às empresas, parte da sua ação fiscalizadora. Em razão disso, as empresas se veem obrigadas a fortalecer os seus controles administrativos e a dispor de Auditores Internos especializados para melhor administrar os tributos incidentes em suas atividades; algumas empresas chegam a contratar Auditores Externos, em caráter excepcional, alguns até oriundos dos quadros fazendários.


José Amândio Barbosa: Auditor Fiscal aposentado, ex-diretor do Departamento da Administração Tributária da Sefaz/Bahia. Autor do livro “Contabilidade Tributária sob o aspecto do ICMS”, uma importante obra, que infelizmente encontra-se esgotada, mas que faz parte do nosso acervo pessoal.

O artigo acima foi publicado originalmente pelo Instituto dos Auditores Fiscais do Estado da Bahia:

BABOSA, José Amândio. Uma abordagem histórico-conceitual da auditoria fiscal. Portal IAF. set. 2024. Disponível em: <https://iaf.org.br/conteudo/9592/jose-amandio-barbosa-e-o-entrevistado-desta-semana> Acesso em 10 set. 2024.


  • Para conhecer um pouco mais sobre o estimado Amândio, confira AQUI sua entrevista ao site do IAF.
  • Confira AQUI uma postagem que fizemos sobre recente descoberta de “nota fiscal” de mais de 4.500 anos

Editoria: Prof. Alexandre Alcantara