Os dados agregados da ECD e sua aplicabilidade na auditoria contábil tributária

Os dados agregados da ECD e sua aplicabilidade na auditoria contábil tributária

Por Alexandre Alcantara

Este artigo contém trechos da segunda edição do nosso livro
Manual de Auditoria Contábil Tributária (lançamento em abril/2025)

Introdução

O arquivo com os dados agregados da Escrituração Contábil Digital (ECD) corresponde à consolidação mensal dos saldos contábeis e das demonstrações financeiras das empresas. Esses dados são gerados automaticamente no repositório do Ambiente Nacional do Sped assim que a ECD é recepcionada.

O fato dos contribuintes possuírem o seu próprio Plano de Contas inviabiliza a realização direta de cruzamentos e batimentos das informações contábeis da ECD com os dados da Escrituração Fiscal Digital (EFD ICMS/IPI) e com os documentos fiscais eletrônicos. Para contornar essa limitação, o arquivo de dados agregados contém, além do Plano de Contas do próprio contribuinte o Plano de Contas Referencial.

O Plano de Contas Referencial (Registro I051), estruturado pela Receita Federal do Brasil (RFB), tem a finalidade de padronizar a classificação contábil dos balancetes periódicos e das demonstrações financeiras, possibilitando a sua vinculação, por meio de um mapeamento DE-PARA, com as contas constante no plano de contas do próprio contribuinte (Registro I050). Essa vinculação entre os dois planos de contas permite uma análise mais eficiente, facilitando o cruzamento de informações contábeis e fiscais, contribuindo para a uniformização e comparabilidade das informações enviadas por diferentes tipos de empresas.

É importante ressaltar que os dados agregados da ECD não incluem informações sobre lançamentos contábeis individualizados registrados no Livro Diário.

Os dados agregados na regulamentação da ECD

Os dados agregados, conforme a Instrução Normativa RFB nº 2.003/2021, correspondem às informações fornecidas na modalidade parcial aos usuários do SPED.

Instrução Normativa RFB nº 2.003/2021

Dispõe sobre a Escrituração Contábil Digital (ECD) – Grifos nossos

Art. 10. Os usuários do Sped a que se refere o art. 3º do Decreto nº 6.022, de 2007, terão acesso às informações relativas à ECD disponíveis no ambiente nacional do Sped.

§ 1º O acesso ao ambiente nacional do Sped fica condicionado à autenticação mediante certificado digital emitido por entidade credenciada pela ICP-Brasil.

§ 2º O acesso a que se refere o caput será realizado com observância das seguintes regras:

I – será restrito às informações pertinentes à competência do usuário;

II – o usuário deve guardar, quanto às informações a que tiver acesso, os sigilos comercial, fiscal e bancário de acordo com a legislação respectiva; e

III – será realizado na modalidade integral para cópia do arquivo da escrituração, ou na modalidade parcial para cópia e consulta à base de dados agregados, que consiste na consolidação mensal de informações de saldos contábeis e nas demonstrações contábeis.

§ 3º Para realizar o acesso na modalidade integral, o usuário do Sped deverá ter iniciado procedimento fiscal dirigido à pessoa jurídica titular da ECD ou que tenha por objeto fato a ela relacionado.

§ 4º O acesso previsto no caput também será permitido à pessoa jurídica em relação às informações por ela transmitidas ao Sped.

§ 5º Será mantido no ambiente nacional do Sped, pelo prazo de 6 (seis) anos, o registro dos eventos de acesso, que conterá:

I – a identificação do usuário;

II – a identificação da autoridade certificadora emissora do certificado digital;

III – o número de série do certificado digital;

IV – a data e a hora da operação; e

V – a modalidade de acesso realizada, de acordo com o inciso III do § 2º.

§ 6º As informações sobre o acesso à ECD ficarão disponíveis para o seu titular no ambiente nacional do Sped.

Os usuários do SPED são assim definidos no art. 3º do Decreto Federal nº 6.022/2007.

Decreto nº 6.022, de 22 de janeiro de 2007

Institui o Sistema Público de Escrituração Digital – Sped

 Art. 3º São usuários do Sped:

I – a Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda;

II – as administrações tributárias dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, mediante convênio celebrado com a Secretaria da Receita Federal; e

III – os órgãos e as entidades da administração pública federal direta e indireta que tenham atribuição legal de regulação, normatização, controle e fiscalização dos empresários e das pessoas jurídicas, inclusive imunes ou isentas. (Redação dada pelo Decreto nº 7.979, de 2013)

§1º Os usuários de que trata o caput, no âmbito de suas respectivas competências, deverão estabelecer a obrigatoriedade, periodicidade e prazos de apresentação dos livros e documentos, por eles exigidos, por intermédio do Sped.

§2º Os atos administrativos expedidos em observância ao disposto no §1º deverão ser implementados no Sped concomitantemente com a entrada em vigor desses atos.

§3º O disposto no §1º não exclui a competência dos usuários ali mencionados de exigir, a qualquer tempo, informações adicionais necessárias ao desempenho de suas atribuições.

O acesso aos dados agregados pelas administrações tributárias

Não é requerida a existência de um procedimento fiscal designado para que as administrações tributárias possam ter acesso aos dados agregados dos contribuintes. Sua requisição pode ser realizada em lote de empresas através do aplicativo ReceitaNetBX. A quantidade máxima de arquivos em cada lote varia conforme os parâmetros em vigor na data da solicitação.

Essa limitação de arquivos por lote não implica restrição de acesso, pois as administrações tributárias podem solicitar quantos lotes desejarem, respeitando apenas o limite em vigor estabelecido para cada solicitação.

As requisições em lote podem ser feitas considerando empresas de um mesmo setor ou segmento econômico, de uma determinada região, pertencentes a um contador específico ou de um grupo econômico, ou critério de seleção definido pelas administrações tributárias, de forma a permitir a construção de uma base de dados ampla e personalizada de informações contábeis para análises.

O sistema ReceitaNetBX é capaz de fornecer os arquivos que constam na base da Secretaria da Receita Federal do Brasil, mediante requisição, para os representantes legais dos contribuintes — ou seus procuradores autorizados por procuração eletrônica, servidores da própria Receita Federal — e entidades conveniadas e demais usuários do Sped, nas quais se incluem as administrações tributárias.

O ReceitaNetBX concede o acesso aos arquivos do Sped, considerando as seguintes regras relacionadas ao perfil do requisitante.

As administrações tributárias devem possuir um protocolo ou norma interna para orientar os critérios a serem observados quanto à forma de requisitar e receber os arquivos correspondentes às “ECD Completas” e aos “Dados Agregados da ECD” diretamente do Ambiente Nacional do Sped, através do ReceitaNetBX.

Essas requisições pelas administrações tributárias somente serão realizadas nas seguintes hipóteses:

  • Arquivos completo da ECD: deverá existir algum instrumento oficial que determine e evidencie o início de procedimento fiscal para determinado contribuinte específico, como por exemplo: uma ordem de serviço, um mandado de procedimento fiscal, ou qualquer outro equivalente. O parágrafo primeiro do artigo 173 do CTN (Lei 5.172/1966) estabelece que o contribuinte deve ser notificado de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento.
  • Arquivos de dados agregados: poderão ser requisitados a qualquer tempo, considerando que esses arquivos não contêm detalhamento das escriturações contábeis, e são utilizados apenas para seleção de empresas que devem ser submetidas a um processo de auditoria contábil tributária.

A análise dos dados agregados

O principal uso dos dados agregados da ECD está relacionado às macroanálises que podem ser realizadas, possibilitando que as administrações tributárias tenham uma melhor objetividade no planejamento da fiscalização, através da identificação de empresas com maior probabilidade de terem cometido fraudes de natureza contábil, e que em razão disto poderão ser submetidas a um processo aprofundado de auditoria contábil tributária

Algumas das macroanálises que podem ser realizadas:

  • Analisar o volume de operações, identificando por exemplo, contas com maior volume de operações ou com volume incompatível para o tipo de atividade ou com a própria média de percentual em relação à receita, verificada entre seus concorrentes.
  • Identificar contas cujos saldos não sejam compatíveis com a sua natureza, a exemplo de conta caixa com saldo credor.
  • Extrair indicadores contábeis e sua ponderação com as médias apuradas em outras empresas do mesmo setor ou segmento econômico no qual o contribuinte atua, na busca por empresas que apresentam desvios em relação à média de seus concorrentes.
  • Confrontar as informações constantes na ECD com as normas tributárias, especialmente no confronto entre a receita declarada na escrituração contábil com a receita declarada na Escrituração Fiscal Digital (EFD ICMS/IPI) ou com os respectivos documentos fiscais emitidos relativo às vendas de mercadorias, produtos ou de serviços prestados, ou aquisição de insumos ou bens diversos.

Considerando que esses procedimentos é algo necessário para um eficiente trabalho de planejamento de ações fiscais, a solução que se apresenta é que esse processo seja realizado de forma automatizada, através de cruzamentos e tantos batimentos de dados que sejam possíveis.

Os aplicativos de auditoria contábil tributária podem ser programados para proceder a correlação sugestiva, nos casos em que não conste na ECD, e nos respectivos dados agregados, as informações do Plano de Contas Referencial, a exemplo do que já é possível no aplicativo de auditoria Contágil Lite, desenvolvido pela RFB e em uso pelas administrações tributárias estaduais e municipais. Essa sugestão de correlação deve ser validada pela equipe de planejamento da auditoria ou pelo auditor, aprovando ou propondo uma nova correlação.

REFERÊNCIAS

BRASIL. ______. Decreto nº 6.022, de 22 de janeiro de 2007. Institui o Sistema Público de Escrituração Digital – SPED. Disponível em <hhttp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6022.htm> Acesso em: 20 fev. 2025.

______. Receita Federal do Brasil (RFB). Instrução Normativa nº 2.003 de 18 de janeiro de 2021. Dispõe sobre a Escrituração Contábil Digital (ECD). Disponível em: <https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/instrucao-normativa–n-2.003-de-18-de-janeiro-de-2021-299786138> Acesso em: 20 fev. 2025.

____. Manual de Orientação do Leiaute 9 da ECD. Anexo ao Ato Declaratório Executivo Cofis no 114/2022. Versão Novembro 2024. Disponível em: <http://SPED.rfb.gov.br/pasta/show/1569> Acesso em: 20 fev. 2025.

SILVA, Alexandre Alcantara da. Manual de Auditoria Contábil Tributária. Vitória da Conquista, BA: Ed. do Autor, 2024

SILVA, Alexandre Alcantara da; CERQUERIA, Anderson Freitas de. Fraudes contábeis: repercussões tributárias – enfoque no ICMS. Curitiba: Juruá, 2018.

Editoria: Prof. Alexandre Alcantara