Receita muda norma e cancela dupla contabilidade

Receita muda norma e cancela dupla contabilidade
Por Alexandre Alcantara
O aviso de uma “possível mudança” na Instrução Normativa 1.397 demonstra que a RFB não estava pondo em prática a tão alardeada “construção coletiva” do SPED. A participação das empresas nas decisões relacionadas ao SPED somente se faz ouvir quando não há desencontros com interesses da RFB. Muito boa a ação dos órgãos de representação da classe contábil neste episódio. Resta aos empresários e classe contábil “ver” a publicação do remendo para saber se efetivamente nada ficará pior.
Outros aspecto interessante foi a matéria do Valor Econômico da semana passada que lança uma pergunta ar: quem efetivamente manda ou (des)manda na RFB? Um trecho desta matéria destaco a seguir:

[…]
Diversos profissionais qualificados, representantes de empresas, de auxiliares dessas empresas (contadores e advogados principalmente), das universidades e de outros órgãos do mesmo governo estavam negociando com a administração tributária o texto de uma medida provisória para tratar do fim do RTT e do tratamento tributário a ser dado às mudanças trazidas pela nova contabilidade (IFRS). No meio dessa negociação, de repente, não mais do que de repente, a Receita Federal publica uma instrução normativa (ato inferior à lei) para disciplinar a matéria, de maneira contrária à lei em diversos aspectos (afronta ao princípio da legalidade).
Como se não bastasse, a referida norma passa a vigorar na data da sua publicação (afronta ao princípio da anterioridade) e atinge fatos geradores ocorridos desde 2008, isto é, abrange eventos e relações econômicas verificados antes da sua publicação (afronta ao princípio da irretroatividade).
Essa atitude da Receita levou a insegurança jurídica a superar todos os limites, chegando a um nível jamais visto antes na história desse país.
[…]

 

Isso nos faz pensar no porquê dessa necessidade das autoridades tributárias de surpreender, de manter em sigilo os seus atos até o momento da sua publicação, de decidir toda a regulamentação tributária no conforto e no isolamento dos gabinetes oficiais. Parece fruto de diversão ou de ressentimento, em qualquer caso, perigoso para o crescimento econômico do Brasil.
Muito melhor seria se a Receita buscasse o diálogo e a transparência, expondo seu ponto de vista e estando aberta a escutar o ponto de vista das empresas, dos acadêmicos, dos contadores e dos advogados, além dos seus pares de governo. Que tal o encaminhamento de projeto de lei sobre matéria tributária, no início do ano, em vez de medida provisória nos estertores do prazo constitucional? E por que não submeter minuta de instrução normativa, ou outro ato administrativo, à consulta pública, assim como já faz a Comissão de Valores Mobiliários (CVM)?

A seguir uma matéria do portal CONJUR sobre o “novo” posicionamento da RFB diante da pressão da sociedade organizada.


Receita muda norma e cancela dupla contabilidade

Apenas 17 dias depois de editar a Instrução Normativa 1.397, a Receita Federal vai mudar o texto da IN, eliminando a necessidade de dupla contabilidade completa das empresas. O texto divulgado em meados de setembro determinava que as contabilidades fossem feitas de forma paralela, uma para atender ao Fisco e a outras para prestar contas aos acionistas. A mudança foi confirmada pelo secretário da Receita Federal, Carlos Alberto Barreto, nesta quinta-feira (3/10), durante reunião com representantes de entidades que reúnem empresas abertas, contadores e investidores. As informações são do jornal Valor Econômico.

Após mobilização durante as últimas duas semanas, as entidades conseguiram que Barreto e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, determinassem a alteração do texto. Os efeitos da IN 1.397 só produzirão efeitos a partir de 2014, e não mais sobre 2008, como defendiam os técnicos da Receita Federal. O governo editará Medida Provisória que deve descartar a cobrança referente ao período entre 2008 e 2013, através de uma espécie de benefício fiscal retroativo.
Na sequência, o texto da Instrução Normativa 1.397 será alterado para indicar que não há necessidade de duas contabilidades. O texto apontará apenas que serão exigidos pequenos ajustes, indicando as diferenças entre o lucro societário apurado com base no padrão IFRS e o lucro fiscal, da forma como ocorre atualmente, mas com mais detalhes. Além disso, o lucro fiscal não será apurado com base nas regras contábeis de 2007, pois a MP deve extinguir formalmente o Regime Tributário de Transição, criado em 2008 para garantir a neutralidade tributária durante a transição do padrão contábil brasileiro para o IFRS.
A nova redação da IN apontará quais pronunciamentos contábeis devem ser considerados para fins fiscais. Além disso, segundo Eliseu Martins, integrante do Comitê de Pronunciamentos Contábeis e um dos participantes do encontro, um dispositivo incluído na MP deve garantir que novas normas contábeis não terão efeitos fiscais até que ocorra mudança na lei. Presidente da Associação Brasileira das Companhias Abertas, Antonio Castro admitiu que os dois pontos mais preocupantes eram a dupla contabilidade e a possibilidade de retroatividade.

Editoria: Prof. Alexandre Alcantara