Grupo lança hoje proposta para novo modelo de balanço

Valor Econômico

 

 
Já faz algumas décadas que as principais empresas do mundo perceberam que não devem gerir seus negócios com foco apenas nos resultados financeiros.
 
Agora chegou a hora de as organizações divulgarem aos investidores, de maneira estruturada, como gerenciam seus diversos "capitais", e não apenas o físico e o financeiro, no processo de geração de valor para o acionistas no curto, médio e longo prazos.
 
Trata-se do relatório integrado, que pretende unir em um único documento informações financeiras, estratégicas e sobre governança das empresas.
 
Numa iniciativa que vai se repetir em onze países ao mesmo tempo, entre os quais o Brasil, o International Integrated Reporting Council (IIRC) vai colocar em discussão pública hoje uma minuta que traz os elementos principais que devem integrar esse documento. A cerimônia de lançamento no país ocorrerá na sede da BM&FBovespa, em apresentação que será conduzida por Sandra Guerra, presidente do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). Os comentários devem ser enviados até 15 de julho.
 
A iniciativa de criação de um relatório que agregará novas informações sobre as empresas não significa que medidas como lucro líquido, geração de caixa operacional e retorno sobre o patrimônio líquido devam ser negligenciadas, uma vez que resumem num indicador financeiro o resultado – ou a consequência – de diversas ações tomadas pela organização até aquele momento.
 
Entretanto, o resultado positivo de hoje não é garantido para a eternidade. É preciso tomar ações no presente para que ele se repita no futuro.
 
E os responsáveis pelo IIRC entendem que não é gerindo apenas o capital financeiro que as organizações alcançarão esse objetivo. Por isso, a entidade lista outros cinco "capitais" que entende que influenciam na geração futura de valor para os acionistas. Eles são: físico, intelectual, humano, social e natural.
 
O capital físico envolve os objetos usados na produção de bens e serviços. O intelectual é composto pelos intangíveis baseados no conhecimento. O capital humano está ligado às competências, habilidades e motivações da equipe de trabalho. O social está baseado no relacionamento que a entidade possui na comunidade e entre as diversas partes interessadas (como clientes, fornecedores, acionistas, reguladores etc.). Por fim, o capital natural é formado pelos ativos ambientais, renováveis ou não, que fornecem ou permitem o fornecimento de bens ou serviços para a entidade.
 
Dessa lista de capitais, o mais comum é que apenas os dois primeiros – financeiro e físico – estejam evidenciados no balanço tradicional divulgado aos investidores. Por isso a decisão de criar uma relatório que mostre para o mercado como a empresa lida com essas outras facetas do seu negócio.
 
Companhias com gestão moderna já tem como prática usar métricas não financeiras como satisfação de clientes e funcionários, qualidade, horas de treinamento e impacto ambiental, entre outros, para calcular o sucesso de sua estratégia de negócios. Mas muitas vezes os resultados dessas medidas são usados apenas internamente pela organização, sem divulgação dos dados para o público externo.
 
Iniciativas como a elaboração de balanços sociais e relatórios de sustentabilidade são usadas por algumas empresas com o intuito de tentar cobrir essa lacuna.
 
Mas embora alguns desses documentos sejam bons, muitos se confundem com ferramentas de marketing e não fazem outra coisa a não ser listar os feitos – quase sempre positivos – das empresas em determinadas áreas.
 
Outra características comum é que esses relatórios adicionais não costumam "conversar" com as demonstrações financeiras.
 
A esse respeito, Sandra Guerra, do IBGC, cita um exemplo que costuma ser dado pelo professor de contabilidade Nelson Carvalho, da FEA-USP e da Fipecafi. No balanço social, a empresa divulga que está na lista das melhores companhias para se trabalhar e que há um clima excelente entre os funcionários. Na nota explicativa sobre contingências dos demonstrativos financeiros, entretanto, aparece uma montanha de processos judiciais trabalhistas contra a organização. "Qual é a empresa de verdade? Esse é um exemplo que mostra a necessidade de integrar os relatórios", diz Sandra.
 
Além dela própria e do professor Nelson Carvalho, a presidente do IBGC diz que o diretor de investimentos em participações da Previ, Marco Geovanne, e o vice-presidente financeiro da Natura, Roberto Pedote, são os quatro brasileiros que integram o conselho de 40 pessoas do IIRC.
 
Antes da elaboração da minuta que será colocada em audiência pública, cerca de 90 empresas fizeram teste piloto para esse tipo de divulgação. Entre as empresas brasileiras que participam do processo estão Petrobras, BNDES, Natura e AES.
 
Em vez de listar pontos específicos que devem ser abordados, a minuta diz que o relatório deve estar baseado em seus princípios. O primeiro é o foco estratégico e a orientação para o futuro. O segundo é chamado de "conectividade da informação", que significa que as empresas devem tentar contar como usam os seis capitais para criar valor, de forma parecida com um filme, e não como uma foto.
 
O terceiro princípio é o da habilidade da resposta da companhia para as partes interessadas. O quarto é o da relevância e da concisão, que deve orientar o quê deve entrar no relatório e também a forma de apresentação.
 
Existe ainda o princípio da comparabilidade, de maneira a garantir que as informações tenham consistência ao longo do tempo e que possam ser analisadas em conjunto com as de outras organizações.
 

Por fim, a minuta fala de "confiabilidade". "Isso significa incluir todos os aspectos relevantes. Não só as coisas boas, mas também as negativas, e de forma equilibrada. Porque isso resulta em credibilidade", afirma Sandra.


Editoria: Prof. Alexandre Alcantara