SUPREMA FELICIDADE CONTÁBIL
Pensei em nada escrever, em nada falar, pensei no silêncio. Mas, considerei conveniente interrogar. Foi então que um amigo, entre outras coisas, sentenciou: “enquanto muitos buscam bálsamos e anestésicos para suas feridas, eu amei tanto as minhas que só enxergo através delas”.
Foi nesse mesmo sentido que o poeta Manoel de Barros disse que a importância de uma coisa não se mede com fita métrica, nem com balanças, nem com barômetros. A importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produza em nós.
Há encantamento bom, como um passarinho nas mãos de uma criança; mas há encantamento ruim, como aquele do bullying contábil (todos os contadores devem seguir o novo padrão contábil, senão serão transformados em sapos, sem direito a ser príncipe um dia).
Olhando esse novo padrão contábil pelo ângulo não oficial, ditado pela Casa dos Sábios, temos que “nunca antes na história desse país” se faturou tanto com essa contabilidade internacional. Faturamento direito e indireto; faturamento financeiro e político; faturamento familiar – sobrinhos e afiliados; faturamento ético e aético; faturamento contabilizado ou não.
Como tenho um grilo com “ele”, meu olhar será através de estória. Vou seguir os conselhos de um amigo, que afirma gostar de contar estórias, pois elas dizem o que têm a dizer de forma curta e descomplicada. Não precisam de muitas explicações. E qualquer um entende. E aqui vai…
Era uma vez (estórias sempre começam assim) em Pasárgada… Determinou-se ali que o padrão contábil fosse modificado; ao invés do padrão local seria implantado um estrangeiro; melhor, internacional. Todos, em qualquer canto do planeta, poderiam reconhecer aqueles números e seus signos.
Ocorre que nessa localidade não havia obrigação formal para que todos seguissem essa comoditie; mas isso não importava, o que importava era a implantação do “negócio”, valorizando a marca pessoal e profissional de toda a classe dos “sapos” (sim, naquele local contador era conhecido como “sapo” – um dia, quem sabe, conto como esse “apelido” pegou por lá).
Para que todos pensassem pensamentos únicos, padronizados, foram criados propagandas e programas oficiais: o fim justifica os meios! Várias frentes de batalhas foram abertas: apoio a todo e qualquer pensamento que seja único; abate das opiniões contrárias; foco maciço no rebanho, para que não haja fuga; cursos e patrocínio oficial aos eventos do pensamento único; transformação de instituições oficiais em promotoras de eventos; faculdades e universidades com pensamento único, e assim por diante.
No campo de batalha – mesmo que sem oposição – o “rei” disponibilizou a base de e-mails dos seus súditos a sobrinhos-afiliados, para, a partir desse meio de comunicação, produzir material de propaganda pessoal e daquele pensamento único, claro. Tudo em nome da padronização de pensamento.
Aquela outrora instituição oficial dos “sapos” passou de profissional à promotora de eventos (basta entrar no “site”), principalmente daqueles com pensamento unidimensional – e se for sobrinho-afilhado, melhor ainda.
Um profissional-“sapo”, acuado pelo bullying contábil, recebeu uma propaganda para um curso sobre mais saberes contabilísticos, patrocinado pela instituição oficial (mais uma vez!); este curso seria desenvolvido totalmente de forma virtual; não seria preciso sair de casa pra conhecer como “fazer” a nova contabilidade (ou melhor, como fazer para fazer como querem que se faça). Custo baixo, facilidade de informação, certificado com chancela oficial… tudo beleza!
Aquele “sapo”, pra não ficar fora de moda, decidiu fazer o curso “oferecido”. Mas a empresa do curso de saberes contabilísticos, patrocinada pela instituição oficial, não emite nota fiscal da inscrição. Paga-se a inscrição através de boleto, e este é o “documento”. Não estão “preparados” para emitir NF.
Seria esse o novo padrão contábil? Pra que NF se a essência prevalece sobre a forma…
O “sapo” saltou fora do curso furado; foi pescar!
Enfim, “nunca antes na história desse país” se faturou tanto com essa contabilidade internacional. Toda a classe dos “sapos” está desfrutando do bônus dessa padronização. Alguns mais do que outros… Mas essa é outra estória.
E todos os “sapos” viveram felizes pra sempre (uns mais que outros, mas todos com a suprema felicidade)!
Marcelo Henrique da Silva, é contador em Londrina.