Discussão ambiental cresce e vira provisão
Marta Watanabe, de São Paulo
Valor Econômico – 24/8/2009
Especialistas explicam que isso não significa que as empresas estão poluindo ou infringindo mais a legislação de meio ambiente. O fenômeno é resultado da exigência cada vez maior dos investidores em relação a possíveis passivos ambientais. Paralelamente, há também regulamentação mais rígida para contabilização das discussões da área. Além disso, há fiscalização acirrada tanto de órgão federais e estaduais, o que tem gerado maior volume de autuações e discussões judiciais. Como resultado natural, surgem as provisões. “É como uma empresa com mão de obra intensiva ou muitas operações. Isso naturalmente gera um grande volume de disputas trabalhistas e tributárias”, compara o consultor Pedro César da Silva, da ASPR Auditoria e Consultoria.
Embora com valores relativamente baixos, as discussões sobre legislação ambiental têm dado origem a um item adicional nas provisões. Nas empresas Vale, Neoenergia, CSN, Eletropaulo e Sabesp, essas disputas são destacadas entre os valores provisionados em uma rubrica específica para “contingências ambientais”. As provisões são tradicionalmente divididas em três áreas: tributárias, cíveis e trabalhistas. As contingências são mencionadas em balanço quando avaliadas como de perda “provável” ou “possível”. No caso de perda provável, há obrigatoriedade de provisão.
A advogada especializada em direito ambiental, Maria Alice Doria, do escritório Doria, Jacobina, Rosado e Gondinho, diz que “nos últimos dois ou três anos houve aumento das contingências ambientais não só em volume como em valores.”
Na área ambiental as contingências podem ser judiciais – originadas principalmente pela atuação do Ministério Público ou por meio de ações populares -, ou administrativas, como resultado de autuações fiscais de órgãos estaduais ou federais que fiscalizam desde contaminação de solo e águas até o cumprimento das obrigações em relação às áreas de preservação.
As contingências indicadas pelas empresas de capital aberto refletem essa diversidade de situações. A Neoenergia, por exemplo, tem nas suas demonstrações consolidadas uma provisão relacionada a um acordo feito em ação popular que pedia compensação dos impactos sócio-ambientais com a implantação da Usina Hidrelétrica de Itapebi. A “reserva” de R$ 19,76 milhões inclui elaboração de estudos, elaboração de manejo e proteção, além de novos projetos desenvolvidos com medidas ambientais compensatórias da exploração do potencial hidrelétrico. Os projetos foram implantados como condição da licença de operação do Ibama, órgão com o qual também foi feito acordo.
Outra empresa de energia elétrica, a Cemig, também registra contingência relacionada a usina. No caso, a construção e operação da usina Nova Ponte. Uma associação discute em ação civil pública indenização por suposto dano ambiental coletivo. A expectativa de perda é considerada possível e não provável. Com base nisso, a companhia não registra provisão.
Na Sabesp, a provisão de R$ 57,36 milhões no consolidado inclui vários processos administrativos e judiciais instaurados por órgãos de fiscalização e também pelo Ministério Público.
Maria Alice lembra que além da processos judiciais e administrativos, as companhias também contingenciam pagamento de compensação ambiental e valores aplicados em programas e medidas compensatórias na implantação de empreendimentos.
A CSN destaca entre suas provisões uma contingência ambiental de R$ 69,38 milhões relacionada a gastos com investigação e recuperação ambiental de potenciais áreas contaminadas em estabelecimentos da companhia no Rio de Janeiro, Minas Gerais e Santa Catarina.
O advogado Fernando Jacob Netto, do Marafon, Jacob Netto e Guariento Advogados lembra que, ao lado do Ministério Público, as organizações não-governamentais também levantam discussões judiciais. Além disso, as empresas também estão sujeitas a ser autuadas sobre o mesmo assunto por órgãos estaduais ou do governo federal. A legislação não define exatamente as atribuições de cada esfera administrativa e isso causa longas discussões no Judiciário.
Para Antonio Lawand, do escritório Braga & Marafon, a maior quantidade de processos administrativos e judiciais não acontece por acaso. Para muitos setores, diz ele, a certificação ambiental tornou-se uma forma de proteção ou de criação de novos mercados. Isso tornou um requisito de mercado o cumprimento de obrigações ambientais. “Para vender ao cliente final ou para comprar do fornecedor é muitas vezes necessário ter uma certificação do setor. E isso só é obtido por empresas que tornam essa informação mais transparente”, explica Lawand.
Como resultado disso, acredita, o direito ambiental no Brasil está num momento de definição de critérios, no qual órgãos estaduais e federais têm baixado regulamentações e, com base nelas, acirraram a fiscalização, principalmente nos últimos três anos. Para Lawand, há um crescimento de autuações principalmente dos órgãos estaduais. “Além de gerar receita, é uma forma dos Estados protegerem seu patrimônio ambiental e, com isso, atrair mais investimentos.”
Via Blog Contabilidade Financeira