Paraísos Fiscais e Tributação
A relativização dos chamados “paraísos fiscais”
De acordo com os incisos I a IV do novo art. 24-A, considera-se regime fiscal privilegiado aquele que se enquadra nas seguintes características:
(a) que tributa a renda à alíquota máxima de 20%;
(b) que tributa os rendimentos auferidos fora de seu território à alíquota máxima de 20%;
(c) que concede vantagem fiscal a um não residente sem exigir a realização de atividade econômica substantiva ou condicionando esse benefício ao não exercício de atividade econômica substantiva; e
(d) que mantenha sigilo quanto à composição societária das pessoas jurídicas, à titularidade de bens ou direitos ou às operações econômicas realizadas.
A primeira observação que se faz é que o conceito de regime fiscal privilegiado passou a coexistir com aquele de país com tributação favorecida. Isso porque o conceito de país com tributação favorecida está relacionado a um determinado país, ao passo que o de regime fiscal privilegiado pode alcançar regiões de um país, pessoas, estruturas e/ou operações específicas ali praticadas, os quais não necessariamente implicariam a classificação de todo o território como um “paraíso fiscal”.
Essa divisão, aliás, já está presente nos estudos da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que, admitindo que todos os países são, de certo modo, “paraísos fiscais” quanto a uma determinada operação, estrutura societária, rendimento, etc., procuram inibir a realização de uma certa operação ou estrutura sem necessariamente enquadrar o respectivo país no conceito de “paraíso fiscal”.
Importante notar, contudo, que alguns dos elementos listados pelo novo art. 24-A da Lei n 9.430/96 para a caracterização dos regimes fiscais privilegiados já foram considerados inócuos e de difícil aplicação em estudos específicos da OCDE. Exemplo disso é a ausência de obrigação de exercício de uma atividade econômica substancial.
O Relatório da OCDE, de 14 de novembro de 2001, sugeriu que os países não mais utilizassem o critério da obrigatoriedade de exercício de uma atividade econômica substancial na caracterização de um regime fiscal privilegiado, e que passassem a dispensar maior atenção à transparência dos atos e à disponibilidade dos países fornecerem informações.
No contexto, portanto, dos estudos já elaborados sobre o tema, o art. 24-A da Lei n 9.430/96 tem a finalidade de adequar a legislação brasileira ao modelo internacional de combate à concorrência fiscal prejudicial, de modo a fiscalizar “as operações favorecidas ou as dependências em que se pratique regime fiscal privilegiado, sem a necessidade de se classificar todo o país no conceito de paraíso fiscal” (conforme discussões da Câmara dos Deputados sobre a conversão em Lei da Medida Provisória n 413/08).
No entanto, a tarefa de identificação desses regimes fiscais privilegiados não será fácil e, caso deixada sob a responsabilidade dos contribuintes, poderia levar a constantes confrontos com a administração tributária, que poderia não concordar com os critérios utilizados para a identificação ou afastamento das operações sujeitas a controle.
Parece-nos que atribuir ao contribuinte o ônus de conhecer em detalhes o regime fiscal sob o qual operam todos os seus fornecedores e clientes domiciliados no exterior seria impor-lhe um ônus desmedido e sem muita segurança.
Por esse motivo é que entendemos que, à semelhança do que ocorre com os países com tributação favorecida, a aplicação da nova regra requer a centralização das informações pertinentes, produzindo efeitos para os regimes fiscais que sejam objeto de lista específica a ser publicada pela Receita Federal do Brasil.
por JULIANA NUNES
Advogada do KLA – KouryLopes Advogados, especializada em Direito Tributário )