Errar é humano, mas como contabilizar a correção do erro?
Por Caio Melo
Nesse artigo, você vai entender os tipos de erros contábeis e o que fazer quando identificá-los.
Imagine que você pudesse selecionar cinco profissionais da contabilidade para montar uma equipe. Entre professores, autores, palestrantes, colegas de trabalho, imagine você montando o seu “time dos sonhos” para realizar a contabilidade de uma única empresa.
Eu posso apostar que, mesmo juntando os cinco maiores profissionais, aqueles que você mais admira, ao olhar as demonstrações contábeis alguma coisa ia passar.
Se teve algo que eu aprendi estudando as normas contábeis diariamente é que elas são amplas. E como as operações das empresas são cada vez mais complexas, o fato é que se você olhar a contabilidade de qualquer empresa com uma lupa você sempre encontrará algo.
Pode ser um erro crasso ou um pequeno deslize. Pode ser um esquecimento ou uma negligência, mas o fato é que erros acontecem.
A questão não é apontar culpados, mas definir o que fazer a respeito.
Por isso, as Normas Brasileiras de Contabilidade abordam a correção de erro. Ou seja, uma vez identificado um erro de contabilização, como agir para reparar isso?
Por onde começar?
Talvez você esteja com pressa. Talvez só queira uma direção para seus estudos. Então vou começar com o mais importante: onde buscar a informação confiável.
Para Pequenas e Médias Empresas (PME), que utilizam a NBC TG 1000, você encontra informação na seção 10 desta norma.
Já para quem utiliza as normas completas, a informação estará na NBC TG 23, que aprova o CPC 23.
Em ambos os casos, vale a leitura da ITG 2000, do item 31 ao 36.
Nem todo erro é igual
Existem diferentes tipos de erro. E o tipo de erro nos levará a uma correção diferente. Por isso, vamos entender cada um:
Estorno:
Quando um lançamento foi feito indevidamente, é preciso “neutralizá-lo”. Assim, se faz um lançamento inverso, anulando-o por completo.
Transferência:
Se o lançamento contábil original foi feito numa conta errada, você transpõe o saldo dali e leva para a conta certa. O valor sai inteiro de um lugar e vai para outro.
Complementação:
Esta é a solução para quando se precisa aumentar ou diminuir parcialmente o valor. Serve para quando o lançamento foi feito a menor ou a maior, mas não anula completamente o saldo original.
Claro que quando o erro é identificado enquanto as demonstrações contábeis não foram elaboradas, você tem a opção de corrigir na origem. Facilidades da vida digital, né? Mas o problema se apresenta quando se constata o erro após as demonstrações contábeis estarem prontas. E aí?
Erros de exercícios anteriores
Quando houve omissão ou contabilização errada, gerando má apresentação das demonstrações, precisamos avaliar se isso decorre de falha ou uso equivocado de informações confiáveis.
Isso pode acontecer por erros de cálculo, erro na aplicação das práticas contábeis, interpretações erradas, omissão… e até mesmo de fraude. Sim, a fraude é um elemento, mas não o único motivo que pode desencadear uma correção de erro.
Enxergamos erros de exercícios anteriores quando a falha decorre de informações que estavam disponíveis na época em que as demonstrações foram elaboradas e essas informações poderiam ter sido obtidas e levadas em consideração.
Só que aqui, lembre-se que a referência é a entidade, não o Contador escondido no escritório. Então imagine que a empresa fez uma compra a prazo, recebeu a nota fiscal, mas “esqueceu” de enviar para o contador. Ou comprou e “esqueceu” de separar essa nota. Essa compra é uma informação confiável, que estava disponível à entidade e poderia ter sido obtida. Então, se as demonstrações foram fechadas sem essa informação (na despesa e no passivo):
Não basta só corrigir, precisa-se explicar
Sempre que há uma correção de erro, é preciso explicar exatamente o que aconteceu. Assim, a norma contábil exige que no lançamento de retificação conste, no histórico, o motivo dessa retificação ter sido feita. Além disso, também a data e a localização do lançamento contábil original, aquele que está sendo alvo da correção.
Claro que se o erro é justamente a omissão do lançamento original, não haverá data e localização do lançamento original (às vezes o óbvio precisa ser dito). Mas quando houver, é necessário que a origem do erro seja identificada.
“Ah, Caio, mas então lançamento fora de época é só fazer e pronto?”
Não. Você deve fazer constar, no histórico, a data da efetiva ocorrência do fato contábil. Além disso, expor a razão do registro em data errada.
Além dos históricos, é preciso divulgar os detalhes. E você já sabe, né? Toda vez que a norma contábil fala em “divulgação”, isso significa… nota explicativa!
Falando de PMEs, a seção 10 da NBC TG 1000 exige as seguintes divulgações:
(a) a natureza do erro do período anterior;
(b) para cada período anterior apresentado, na medida do possível, o valor da correção para cada rubrica das demonstrações contábeis afetada;
(c) na medida do possível, o valor da correção no início do período anterior mais antigo apresentado;
(d) uma nota explicativa, caso seja impraticável determinar os valores a serem divulgados em (b) ou (c) acima.
Mas e como teria sido?
Além de contabilizar a correção do erro com seu histórico e divulgar em notas explicativas os detalhes, é preciso atentar para mais uma etapa importante: a reapresentação.
Basicamente significa apresentar as demonstrações como teriam sido lá atrás se a contabilização tivesse sido feita corretamente desde o início.
Obviamente não se pode voltar no tempo. Claro que não há o que se falar em “retificar” o livro diário. Mas no livro diário de agora (exercício em que o erro foi identificado), você precisa não só contabilizar a correção, não só divulgar os detalhes do erro corrigido, mas reapresentar as demonstrações contábeis com o efeito retrospectivo.
Respeitando a comparabilidade das demonstrações, você não vai simplesmente apresentar “esse ano” e “ano passado”, mas deverá apresentar também “como teria sido o ano passado se lá atrás o lançamento estivesse certo”.
“Mas Caio, isso dá muito trabalho!”
Fazer certo desde o início é sempre mais fácil que corrigir o erro. Mas assim é a vida… errar faz parte, mas corrigir (e corrigir direito) também.
O fato é que a maioria das pessoas não faz a correção de erro corretamente. São três etapas: escriturar (lançar), divulgar (notas explicativas) e reapresentar (demonstrações contábeis). A maioria só faz a primeira etapa e acha que tá arrasando.
Aqui eu sou obrigado a ser repetitivo. O nível técnico na contabilidade nada tão baixo, mas tão baixo, que só de você saber corrigir um erro da forma apropriada, você já se diferencia no mercado contábil.
Eu sei que esse artigo ficou mais teórico e talvez você tenha se sentido um pouco inseguro em como aplicar isso. Por isso, anota aí: eu vou liberar pra você assistir uma aula gratuita explicando e exemplificando tudo isso.
Autor: Caio Melo – Contador, proprietário da Caio Melo Capacitação Profissional. Professor em MBA pela BSSP Centro Educacional. Idealizador da Formação em Contabilidade Imobiliária, da Formação em Holding e do Contabilidade Sem Mimimi.
Publicado originalmente em: Portal Contábeis | 17/05/2021