OPINIÃO: Idéias para uma tributação inteligente

Idéias para uma tributação inteligente

por César A. Fonseca*

 

Um médico pode compreender um pouco de economia. Um economista pode compreender um pouco de medicina. Mas só o especialista pode falar com autoridade sobre uma matéria específca, para a qual se tenha preparado. Ainda assim, certas ilações podem ser feitas por um administrador tributário, com formação em Administração de Empresas e em Direito.

 

Algumas "verdades" que tem sido difundidas no Brasil, não são tão verdades assim. Por exemplo, tributação no destino tem sido confundida com arrecadação no destino, o que são coisas diferentes. Tributação no destino deve significar que o tributo arrecadado deve ser gasto no financiamento do local onde ocorreu o dispêndio de renda. Por isso, no comércio eletrônico, se a renda das famílias baianas for utilizada na compra de bens em São Paulo, o IPI e o ICMS incidentes devem ser carreados para a Bahia, que tem a responsabilidade de prover os recursos financeiros e executar o serviço público local.

 

A arrecadação do comércio eletrônico pode ser feita em São paulo, mas o produto da arrecadação deve ficar com a Bahia. Assim, a expropriação de riqueza através do tributo beneficiará a população que revelou, na aquisição das mercadorias, riqueza tributável. Esse sistema de arrecadação já é comum no Brasil: os estados arrecadam o imposto devido aos municípios (1/4 do ICMS), que é automaticamente transferido para cada um deles mediante operação bancária. Também é assim com o IPI devido aos estados e municípios. Já a arrecadação no destino exigirá forte esforço de controle tributário e arrecadação.

 

Para os professores Antonio Carlos do Santos (Portugal) e Sangmeister (Alemanha), a tributação com controle e arrecadação no destino na União Européia seria um desastre em termos de produtividade do imposto, face a necessidade de um oneroso sistema de controle das fronteiras, por cada um dos 27 estados nacionais, o que contraria a idéia de liberdade na circulação de bens e de pessoas, um dos pilares da construção da União Européia. Por isso a 6a. Directiva Européia diz que a UE deve adotar a tributação na origem, somente admitindo a tributação no destino em casos especiais e enquanto não for possível atingir o ideal da tributação na origem.

 

Tenho tomado a liberdade de dizer que a desoneração das exportações de mercadorias não processadas industrialmente no Brasil é um crime de lesa pátria, pois permite a remessa para o exterior de riquezas minerais e agropecuárias, com baixo nível de transformação, implicando indiretamente na exportação de empregos industriais.

 

É comum ouvir-se dizer que não se deve exportar impostos. Mesmo sem recorrer às teorias de David Ricardo ou Celso Furtado, é pacífico para todos que não se deve fazer incidir impostos sobre a exportação de mercadorias cuja industrialização cumpriu a função social do capital, por meio da geração de emprego e renda.

 

Mas exportar couro para que a Itália produza sapatos de alto valor; exportar grãos de soja, para que a Espanha, ou qualquer outro país, venha a ser o maior produtor de margarina da União Européia sem plantar uma única semente, não atende aos desejos de uma nação que não pretenda ser apenas agrário/exportadora e sim industrial/agro/exportadora ou industrial/minero/exportadora.

 

Por isso, devemos insistir para que os estados se preocupem mais com o adensamento da aplicação do trabalho industrial nas cadeias de produção/circulação até o consumo, ou até a exportação, em desenvolver a matriz tributária constitucional, para refletir os interesses da Nação, do que se preocuparem apenas  com o ressarcimento da famigerada Lei Kandir.

 

Embora a autora seja de extrema direita, o que a afasta da verdade universal, transcrevo aqui algumas frases e respostas de Marie le Pen, que se não são verdades, nos levam à reflexão:

'Na globalização, escravos fabricam os produtos que são vendidos aos desempregados'

 

Sobre programa econômico

A principal ideia é que uma economia deve ser fundada sobre o empresariado, mas deve dar as costas à especulação e às grandes potências financeiras, que prejudicaram a economia do nosso país. E a segunda ideia é a da nossa soberania monetária, orçamentária e a nossa capacidade de colocar emfuncionamento um protecionismo razoável e inteligente, como fazem todas as grandes nações do mundo: dos EUA ao Canadá, passando pela Rússia e pela China.

 

Sobre protecionismo inteligente

São métodos fiscais e aduaneiros que permitem voltar a industrializar nosso país e a evitar a concorrência internacional desleal, que nós observamos na  França e que tem custado milhares de empregos no setor industrial. Depois que a União Europeia abriu as fronteiras do continente ao livre comércio, há produtos como aqueles vindos da China ou da Índia com os quais nós evidentemente não podemos competir. O nosso sistema de proteção social, as normas ambientais e de segurança fazem com que o nosso produto tenha mais custos do que aqueles produzidos nos países emergentes.

 

Sobre o acordo de livre comércio que o Brasil negocia com a Europa

Sim, sou contra, apesar da simpatia que tenho pelo Brasil, com quem a França tem muitos pontos em comum. Acredito que os dois países devem fechar uma parceria energética porque o Brasil já é um grande produtor de petróleo e a Petrobras tem reservas de bilhões de barris. A meu ver, porém, à França não interessa esse acordo de livre comércio, que terminaria de arruinar a capacidade econômica do país.

 

Sobre a globalização?

Sim. A globalização consiste no uso de trabalho escravo para fabricar produtos que, depois, são vendidos aos desempregados. Sobre ficar ficar à margem da globalização?

 

Eu acho que a globalização é um fato, mas também uma ideologia. Uma ideologia de comércio que dá à lei do mercado o direito de esmagar tudo em sua passagem: as tradições, os países, as leis e o sistema de proteção social. Eu sou contra isso. É preciso voltar às trocas entre nações soberanas e aos acordos bilaterais que existiam antes da abertura total das fronteiras. Hoje, a União Europeia está isolada no mundo porque é a única totalmente dedicada ao comércio livre sem nenhum sistema de proteção do seu mercado interno. Todo mundo vive assim e nós estamos morrendo.

 

Sobre o FMI?

Eu acho que o FMI não é mais o que nós esperávamos: um organismo internacional que ajudaria países em dificuldade sem desrespeitar a soberania deles. Hoje em dia, o FMI está a serviço exclusivamente dos mercados financeiros e especulativos. É a entidade que chega aos países e diz: “os salários e as aposentadorias devem baixar, você deve vender tal coisa, ou privatizar a integralidade do serviço público”, mergulhando o país numa situação mais difícil do que antes da intervenção. Trata-se de um organismo que se tornou profundamente nefasto.

 

Sobre a modernidade e o futuro?

O que é a modernidade? Voltar à Idade Média? A modernidade de hoje está rodeada por pobreza e miséria. Traz pobreza não só aos países que era ricos, mas também àqueles que já eram pobres, como os do continente africano. A globalização é a competição, a especulação, e isso está provocando os motins em uma série em países da África. Eu não acredito que a globalização excessiva e sem qualquer regulação seja uma prova de modernidade. Eu creio que, ao contrário, se trata de uma prova de arcaísmo e recuo social.


Cesar A. Fonseca – Bacharel em Direito,  Especialista em Direito Tributário Estadual e em Direito Internacional Fiscal e Integração Econômica, Auditor Fiscal da SEFAZ Bahia.


Editoria: Prof. Alexandre Alcantara